BIMBA DE BODE: "NÃO FALTO, NEM RASURO O PONTO"

               *Por Luciano Aguiar  
A consciência de classe é o martelo preferido no filosofar. O dramaturgo Plínio Marcos, numa conferência realizada no auditório da Reitoria da Universidade Federal de Alagoas, lá pelos anos 70, relatou o episódio de uma companhia de teatro que percorria pequenos vilarejos, pinçando os problemas locais de infraestrutura. Na ocasião, o tema escolhido para encenação foram as péssimas condições do único transporte coletivo existente na comunidade.

À noite, os moradores reunidos na praça, coladinhos uns aos outros, de olhos arregalados, assistiam à encenação das dificuldades de locomoção dos trabalhadores, num único ônibus, completamente desmantelado, que, quase sempre, só pegava no empurrão e quebrava todos os dias. O resultado era falta ao trabalho e rasuras no ponto, pelo atraso.

No último ato, já com os ânimos exaltados pelo direito à cidadania, surge entre os manifestantes, um rapaz franzino de mochila nas costas com dois coquetéis molotov nas mãos, insuflando os demais a queimarem o ônibus, como forma de protesto, pelas péssimas condições do transporte.

Quando tudo parecia resolvido, ergue-se no centro da praça, bem no fim da plateia, um ancião de uns 80 anos, com um berro suave, que diz para os atores: parem aí! Todos se voltam espantados pela interjeição e ouvem estarrecidos, com os ânimos à flor da pele: Só existe esse ônibus, e vocês querem queimar. Amanhã não falto, nem rasuro o ponto?

Revejam, retrasem, deem as cartas a si mesmos. Segue nós...











 * Luciano Aguiar é colunista do Blog Ferreira Delmiro